MARATONA: O MEDO E O FASCÍNIO DOS 42.195 METROS
- Rogério Mateus
- 9 de mar. de 2020
- 4 min de leitura
A história se repete constantemente: a maioria dos corredores iniciantes diz que jamais fará uma maratona. Inúmeras vezes já ouvi frases como “É uma loucura correr tanto assim”, ou, “Isso não é pra mim”, e sempre concordo com elas. Mas eu sei, por experiência acumulada, que essa opinião mudará. E muda.
Quando você começa a correr, tudo não apenas parece ser um desafio, tudo, de fato, é um desafio. Até que se atinge a primeira grande conquista: conseguir manter uma corrida por 30 minutos sem parar. Depois disso, os primeiros 5km chegarão rapidamente. Uma prova de 10km? Por que não? E esses mesmos 10km, que pareciam tão cansativos, quase infinitos, com o passar do tempo vão ficando corriqueiros. Daí para frente, é natural do ser humano buscar novos desafios. Surge, então, como a próxima grande meta a ser superada, a meia maratona. 21,09km é uma distância que exige um maior tempo de preparação, planejamento e cuidados muito mais específicos. Vencida a meia maratona, não tem como, é inevitável: aquela distância que parecia tão distante e impensável, aquela loucura só cometida por loucos profissionais, passa a ser um sonho.
Acredito que esse desejo de superação, e a possibilidade de correr a mesma prova realizada por grandes atletas da elite, sejam alguns dos principais motivos que levam tanta gente a participar das diversas maratonas no Brasil e no mundo.
Ocorre que existe um longo caminho entre o sonho e a realidade de se completar uma maratona. E é um caminho penoso, cheio de obstáculos e armadilhas, o que exigirá muita dedicação para ser superado. Por dedicação, entenda-se: muito treino e algumas privações.
Como treinador, tenho minha posição em relação ao momento correto de começar a pensar numa maratona, sempre falo e defendo isso com meus alunos. Primeiramente, me rendo ao fato de que a maratona tem toda uma magia, uma história, um encanto desafiador (ou um desafio encantador). É, sim, o êxtase de todo corredor. E não se atinge o ápice sem vencer cada degrau, ou seja, superar todas as fases necessárias. E essas fases são anos de treinamento e provas. Por isso digo: primeiro corra muitas provas de 10km, melhore seu tempo, vença outras metas, gaste muitos pares de tênis no asfalto e na terra e faça várias meias maratonas antes de encarar uma inteira.
Eu fiz minha primeira maratona quando já corria há pelo menos 10 anos. Antes disso não me achava preparado, não tinha tempo disponível para o exigente treinamento necessário.
E treinamento é o fator determinante. E treinar para maratona exige tempo. São, em média, 4 dias por semana dedicados aos treinos de corrida e mais 2 ao fortalecimento muscular (um dos aspectos mais cruciais, afinal, não basta correr, é preciso estar forte para aguentar correr), o que incluirá no cardápio a musculação ou um treino funcional.
Tudo isso por, pelo menos, 6 meses. Um planejamento detalhado e personalizado, que, para ser cumprido, exigirá muita dedicação e muito empenho.
Decidir entrar num treinamento para maratona é estar ciente de que o caminho é longo e desgastante. É entender que aquela balada de sexta à noite poderá ser descartada, para não prejudicar o treino de sábado, e que, na balada de sábado, talvez você tenha que permanecer sentado, pois suas pernas estarão cansadas.
Para além da preparação física – com longos, quase intermináveis nas madrugadas de sábado – aspectos como a disciplina na alimentação e o preparo mental fazem parte do pacote de itens essenciais.
O planejamento é executado em ciclos. Os primeiros meses são dedicados aos treinos de base. Não são os treinos mais adorados pelos atletas, porém, são essenciais. É a hora de ganhar volume de treino e ficar forte. Em seguida, o treinamento se torna mais específico, com treinos de ritmo e tiros passando a ser mais frequentes. Finalmente, nas últimas semanas, vem o tão esperado polimento, é a hora de "tirar o pé", diminui-se drasticamente o volume dos treinos, pois o que tinha que ser treinado já foi. É o momento de recarregar as baterias para o grande dia.
O dia da prova é apenas a cereja do bolo. A maratona real é o caminho para se chegar nela. É toda a preparação envolvida, todos os dias que, mesmo cansado, você vai acordar cedo, tirar energia de onde nem imaginava que ainda havia alguma e ir para mais um treino.
No dia "D" é preciso ainda torcer para não estar fazendo muito calor, para acordar num dia bom, para que os hormônios (no caso das meninas) não atrapalhem. Tudo em perfeita sintonia para que a corrida flua conforme o esperado e treinado.
O bom da corrida é que ela é muito justa. Você vai correr aquilo que treinou. E ponto. Não existe mágica. Aquele ritmo que foi treinado será realizado. Existe, sim, aquela empolgação do dia da prova, que sempre nos faz ir um pouco além, mas isso é mais evidente em provas curtas. Em provas longas, são enormes as chances de você não conseguir concluir, caso comece num ritmo mais rápido do que o treinado. Por isso, definir a estratégia da prova com seu treinador (e segui-la com disciplina) é fundamental para o sucesso da empreitada.
Muitos dizem que “você será outra pessoa, depois de concluir sua maratona”. E eu concordo totalmente com essa afirmação. É um conjunto de emoções e sentimentos difíceis de explicar. O fato de vencer toda aquela distância, exclusivamente com suas próprias forças – resultantes de meses de treinos pesados, de superação, de entrega e empenho – traz um impulso gigantesco na sua autoestima. Você se sentirá poderoso. É não é para menos. É merecida toda festa, toda alegria e satisfação. Suas pernas estarão em frangalhos, seus pés doloridos; você terá, talvez, perdido algumas unhas, mas estará feliz da vida, radiante e, para desespero do seu treinador, já estará pensando em quando será a próxima maratona.
O DIÁRIO DOS FUTUROS MARATONISTAS
Nas próximas publicações, a cada semana farei um breve resumo do treinamento de 3 alunos que, em 2020, farão suas primeiras maratonas. A finalidade é mostrar o passo a passo do processo de treinamento e como cada aluno absorve e evolui. E, claro, os 3 alunos terão espaço para descrever suas sensações e impressões de como está sendo a experiência e compartilhá-la com vocês.
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